Espaço para reflexão dos alunos do Professor Doutor Mauro Betti. Programa de Mestrado e Doutorado em Educação. Faculdade de Ciências e Tecnologia - FCT. Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" - campus de Presidente Prudente.
Os textos que baseiam a discussão a seguir, tratam-se de uma monografia intitulada "Análise semiótica de A boneca e o saci: o livro em que o criador se tornou criatura" e o meu projeto de mestrado intitulado "Compreendendo contos e recontos: o papel das conexões com alunos de 5º ano do ensino fundamental" (ainda sendo aperfeiçoado).
Como se vê, meu projeto tem como objeto de estudo a literatura infantil, tema esse que me atrai e que, por esse motivo, me fez pesquisar a semiótica na literatura e encontrar essa monografia. Ao lê-la, encontrei pontos em comum e que gostaria de compartilhá-los aqui no blog.
A princípio, a monografia aplicou a semiótica de Peirce analisando a obra A boneca e o Saci de Lino de Albergaria e de ilustração de Andréa Vilela e a compara com a biografia Monteiro Lobato: furacão na Botocúndia de Carmen Lucia de Azevedo. Teve como objetivo reconhecer as tríades que correspondem à teoria pierciana na capa e contra capa da obra, além de outros conceitos como: Análise de Discursos e Teoria Literária
O efeito de contrastes encontrados na estrutura da capa do livros, para a autora, sugerem outros contrastes, nesse caso, existente entre passado e presente, e que permite dar significação à obra. Por se tratar de uma biografia, o livro atualiza alguns fatos ocorridos na vida de Lobato.
O trecho da monografia a seguir, talvez seja o que mais ilustra a relação com o meu projeto de mestrado, que, mais adiante, vou explicar o por quê.
"Devido à ampla divulgação da obra de Monteiro Lobato, por diversos meios, desde sua criação até os dias atuais, o conhecimento cultural que se tem do sin-signo "boneca", quando associado ao sin-signo "Saci", existente no folclore brasileiro, dota o signo a atuar como legi-signo. A boneca em questão trata-se, portanto, de uma boneca de pano, que, por convenção cultural, simboliza na cultura brasileira personagem Emília, que, por sua vez, representa o renomado autor de literatura infantil. É por esse processo que o leitor reconhece, sem nenhuma indicação da linguagem verbal e até mesmo sem, talvez, nunca ter visto uma foto do criador de Emília, a imagem masculina na ilustração da capa do livro como sendo a de Monteiro Lobato, e pode deduzir tratar-se a obra de uma biografia, atualização de um gênero consagrado" (BERDARI, 2005, p. 18)
A relação ocorre porque o meu projeto visa identificar o repertório cultural das crianças no que diz respeito à experiência, o contato que tiveram com os clássicos da literatura infantil e a partir de então, utilizar dos recontos para facilitar a estratégia de leitura conexão (texto-texto/ texto-leitor/ texto-mundo). Assim sendo, a citação torna-se verdadeira quando admite que é preciso que os leitores tenham esse tipo de repertório cultural, seja através da leitura, do meio televisivo ou de qualquer outro tipo de contato, para que esse signo possa atuar como legi-signo. Em outras palavras, para que os leitores sejam capazes de reconhecer a boneca de pano como a Emília é preciso que façam uma conexão, no caso texto/texto, e ainda uma segunda conexão para chegar-se ao autor Monteiro Lobato.
A importância do repertório cultural, bem como a capacidade de fazer conexões, confirma-se no trecho:
"No texto, estão presentes, além de Emília e do Saci Pererê, referências aos livros escritos, editados e publicados por Monteiro Lobato; à luta do escritor em favor da produção de ferro e petróleo no Brasil, que remete à obra O poço do Visconde; a
Dom Quixote de La Mancha, personagem de Miguel de Cervantes, do qual o próprio Lobato se apropria para escrever D. Quixote das crianças, e a outros elementos da
série. Para apresentar fatos da vida e obra do ilustre brasileiro, Lino de Albergaria instaura como narrador-personagem, em primeira pessoa, o próprio Saci Pererê, que, depois de se apresentar como "menino negrinho, que gosta de noite bem escura e de viver no mato, onde há umas plantas chamadas taquaras"[2], visita a Fazenda São José do Buquira, onde viveu o biografado. Lá, encontra-se com Emília, com quem conversa sobre o renomado escritor. É a partir do diálogo entre as duas personagens que se constrói a narrativa histórica, que apresenta também um caráter literário ficcional" (BERDARI, 2005, p. 21-22)
Logo, vê-se que para uma melhor compreensão é preciso que se tenha leituras anteriores.
Ao final, Berdari (2005) finaliza dizendo que "o livro fornece "pistas" de leitura que serão mais ou menos apercebidas pelo leitor, a depender do seu conhecimento de mundo" (p. 26)
Àqueles que se interessam pelo assunto, sugiro a leitura completa da monografia que traz além dessa citadas, outros conceitos da semiótica e a leitura do livro " A boneca e o saci: o livro em que o criador se tornou criatura".
Abraços,
ANA LAURA
Repensando a formação continuada a partir da proposta teórico metodológica da
Pesquisa-ação
Os estudos sobre pesquisa-ação na disciplina: “ Entre os saberes docentes e aprenderes discentes: questões
teóricas e metodológicas”, ministrada pelo professor Mauro Betti, tem me
feito refletir muito sobre minha prática
profissional e me seduzido,
efetivamente, pelo seu caráter formativo e emancipador. As leituras têm me mobilizado internamente, produzido um certo
incômodo não só sobre meu
papel de formadora mas sobre a falta de
projeto de formação continuada eficaz
das secretarias de educação nas escolas.
Assim, como profissional da educação, ocupando
um espaço de gestora e por sua vez
formadora na escola, vislumbro a pesquisa-ação como uma abordagem teórica e metodológica profícua
na formação continuada
por basear-se na ação reflexão, na participação do
professor como sujeito produtor de conhecimento a partir do seu ofício e desta
forma autores de transformações
necessárias.
Fico imaginando como realizar na escola em parceria
com os que lá trabalham a
investigação de nossa prática para
melhorá-la cada vez mais. O
desafio maior que sinto é saber mobilizar o outro para
investigar, o desejo de pesquisar a prática, o local de trabalho, se virem
como autores, produtores de conhecimento,
estabelecer uma relação boa,
significativa com o saber .
Aos
responsáveis pelas políticas públicas de formação continuada local e
nacional se portarem como pesquisadores colaborativos na e pela formação
continuada nas escolas,enfrentar o desafio de buscarem referenciais na pesquisa-ação, que tenha por princípios:
•
a ação conjunta entre
pesquisador-pesquisados;
•
a realização da pesquisa em ambientes onde
acontecem as próprias práticas;
•
a organização de condições de autoformação
e emancipação aos sujeitos da ação;
•
a criação de compromissos com a formação e
o desenvolvimento de procedimentos crítico-
reflexivos
sobre a realidade;
•
o desenvolvimento de uma dinâmica coletiva
que permita o estabelecimento de referências
contínuas
e evolutivas com o coletivo,no sentido de apreensão dos significados
construídos e em construção;
•
reflexões que atuem na perspectiva de
superação das condições de opressão, alienação e de massacre da rotina;
•
ressignificações coletivas das
compreensões do grupo, articuladas com as condições sociohistóricas;
•
o desenvolvimento cultural dos sujeitos da
ação.(FRANCO, 2005, p.485)
A mim fica
o desafio nada fácil, pessoal e profissional, de estudar a metodologia da pesquisa-ação, para gestar na escola espaços de formação continuada
nestes moldes na escola, pois o que
desejo, pretendo é “ assumir os
dois papéis, de pesquisador e de participante, e ainda sinalizando para a
necessária emergência dialógica da consciência dos sujeitos na direção de
mudança de percepção e de comportamento.(idem, p.483)”
Contemporaneamente fazemos parte de uma sociedade altamente letrada e nos deparamos em
todos os momentos no nosso cotidiano com situações de leitura e escrita. Neste sentido, a instituição escolar assume
a importante
tarefa de ensinar a ler e
escrever num registro culto,
fazendo-se necessário para isso, que os educadores reflitam sobre suas
concepções de ensino e, a partir delas, concebam novas práticas
pedagógicas que proporcionemum constante e consistente processo
de aprendizagem da língua maternaàs crianças
e
aos jovens a partir do ambiente
escolar.
Podemos observar que
nos últimos anos os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs – (BRASIL,
1997) surgem para orientar o trabalho dos
educadores brasileiros e os mesmos reiteram que é papel da escola oferecer ao
aluno o convívio com a linguagem ao
apresentar-lhes situações
que valorizem as
práticas sociais de compreensão e produção de textos e de análise linguística,
nas modalidades oral e escrita, de maneira progressiva e em sua diversidade.
Neste sentido, os PCNs advogam que:
uma prática constante de escuta de textos
orais e leitura de textos escritos e de produção de textos orais e escritos [...]
devem permitir, por meio da análise e reflexão sobre os múltiplos aspectos
envolvidos, a expansão e a construção de instrumentos que permitam ao aluno,
progressivamente, ampliar sua competência discursiva”. (BRASIL, 1998, p. 27).
Assim, as propostas curriculares para o
ensino de língua materna no Brasil de acordo com Parâmetros Curriculares
Nacionais (BRASIL, 1997) visam desenvolver nos alunos as capacidades relacionadas
às quatro habilidades linguísticas básicas: falar, escutar, ler e escrever.
Tais habilidades estão organizadas em torno dos eixos didáticos de “leitura”,
“produção de textos escritos”, “oralidade” e “análise linguística” devem ser
propostas como práticas complementares e relacionadas.
Em relação ao ensino da produção
textual na instituição escolar, podemos constatar que as situações de emprego
da língua na sala de aula são artificiais, uma vez que no ambiente da sala de
aula, os estudantes não escrevem livremente, como destaca Chiappini (2002, p.
24) “fazem redações, segundo
determinados moldes” e os discentes escrevem textos para que o professor leia,
ou seja, o educador é o único leitor dos textos produzidos pelos alunos (Geraldi, 1996). Assim sendo, os
docentes oferecem situações de escrita que existem somente nos contextos
escolares e que foram elaboradas exclusivamente com a intenção de cumprir as
exigências da instituição escolar e pouco contribuem para a formação de
produtores competentes de textos. Até o momento, descrevemos o que ocorre na sala de aula em relação ao
ensino de Língua Portuguesa. Podemos a partir dos estudos realizados na
disciplina podemos refletir que na escola ocorre uma “comunicação, engessada em
um molde,” e como funciona “de uma maneira rotineira,” perde seu “poder
educativo.” (TURRICI, 2002, p. 3). Neste sentido, podemos dizer que o
ensino da Língua Portuguesa, em especial da escrita, neste caso, está extirpada
da realidade em que o aluno e a comunidade vivem, ou seja, os professores
oferecem aos discentes estudos sobre as regularidades gramaticais e acreditam
assim que os estudantes irão aprender a escrever uma “redação” sem gerar
conflitos reais.
Patricia Turrisi (2002) em
seu artigo discorre sobre a necessidade do currículo estar baseado na
experiência, assim como John Dewey expõe e como o Pragmatismo de Pierce se
estrutura. De acordo com o texto, o educador deve partir de situações que gerem
problematizações para os educandos, pois assim os estudantes podem inquirir e
problematizar, desta forma o docente estará utilizando uma prática educativa
mais próxima dos pressupostos teóricos de Dewey e procurando estruturar seu trabalho
a partir do Método Científico.
Neste sentido podemos dizer que o ensino da escrita pode ser proposta
por meio de um “aprendizado colaborativo, discussão, problem solving, escrever para aprender e ensinar o colega,
técnicas que estimulam a interpretação e a avaliação do fenômeno dado” (TURRICI, 2002, p. 6) sendo o próprio ato de escrever uma experiência que
precisa “ser formulada para ser comunicada. Formular significa sair dela,
enxergá-la como o outro a veria, considerar quais pontos de contato ela tem com
a vida de outro de maneira que ela possa ser submetida a uma tal forma que ele
possa apreciar seu significado.” (TURRICI,
2002, p. 2)
Desta
forma, seria necessário que a escola proporcionasse às crianças um ensino em
que se priorizasse e valorizasse “a relação entre o conhecimento e a
experiência da realidade.” (TURRICI, 2002,
p. 5)
Acreditamos
que a escola poderia fazer “a promoção ao status
de pensadores críticos e pesquisadores” (TURRICI,
2002, p. 3) dos estudantes
por meio de “um sistema de educação no qual a instrução do significado se seu aprendizado,
pelo estudante individual, é considerada uma prioridade.” (TURRICI, 2002, p. 4), entretanto vemos que um primeiro problema seria a atual
estrutura de formação docente, pois de acordo com Sacristán (2000) faz-se
necessário proporcionar maior espaço de participação aos professores nas
decisões, o que requer, necessariamente, investimento efetivo na sua formação.
O investimento em formação
profissional irá proporcionar igualdade de condições nas negociações sobre
currículo, pois assim os professores terão maior acesso: a fundamentação
teórica sobre os diversos aspectos constituintes do desenvolvimento do processo
pedagógico; domínio das concepções de currículo e suas implicações práticas;
visão de conjunto do sistema educacional, diagnóstico preciso de seus
principais problemas e acesso às possibilidades de solução, permitindo aos
educadores que desenvolvam habilidades para buscar a experiência de
aprendizagem de leitura mais adequada para atender os interesses dos alunos.
Neste sentido, quando falarmos de
um método pragmatista de educação constatamos que ele ainda se encontra distante
de nossa realidade, pois “A lógica não é uma aquisição natural, portanto o treinamento
em lógica seria um requerimento para professores assim como para estudantes” (TURRICI, 2002, p. 13) e nas Unidades Escolares não temos um ensino que valorize
tal conhecimento.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL.
Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais - 1ª
a 4ª séries. Brasília, MEC/SEF, 1997.
CHIAPPINI, Ligia. A circulação de textos na escola: um projeto de
formação. In: CHIAPPINI, Ligia (Org.). Aprender e ensinar com textos
didáticos e paradidáticos. São Paulo. Editora Cortez, 2002. p. 7-15.
GERALDI,
João Wanderley. Da redação à produção de texto. In: CHIAPPINI, Ligia (Org.). Aprender
e ensinar com textos de alunos. São Paulo: Cortez, 1997, p. 99-117.
SACRISTAN, G. Currículo: uma reflexão sobre a prática.
Porto Alegre: Artes Medicas, 2000.
TURRICI,
Patricia. O Papel do Pragmatismo de Pierce na Educação, COGNITO;
Revista de Filosofia. University
of North Carolina at Wilmington- USA, 2002.
A discussão que farei a seguir tem como base o artigo "Sobre a pesquisa-ação na educação e as armadilhas do praticismo" de Marilia Gouvea de Miranda e Anita C. Azevedo Resende (referencia ao final). Fiz uma pesquisa na base Scielo e acredito que seja pertinente a discussão neste blog.
De acordo com as autoras, a pesquisa-ação surge como uma possível solução para o grande impasse da educação: articular teoria e prática. Além disso, a pesquisa-ação visa transformação tanto de ação como de discurso.
Carr e Kemmis (apud MIRANDA e RESENDE, 2006) formularam a sua concepção de pesquisa-ação em educação e revelam que há 5 exigências que devem estar presentes:
a) rejeitar as noções positivistas de racionalidade, de objetividade e de verdade; b) admitir a possibilidade de utilizar as categorias interpretativas dos docentes; c) encontrar meios para distinguir as interpretações que estão ideologicamente distorcidas das que não estão, devendo proporcionar também alguma orientação sobre como superar os auto-entendimentos distorcidos; d) preocupar-se em identificar aspectos da ordem social existente que frustram a obtenção dos fins racionais, devendo poder oferecer explicações teóricas mediante as quais os docentes vejam como eliminar ou superar tais aspectos; e) reconhecer que a teoria educativa é prática no sentido de que a questão de sua consideração educacional seja determinada pela maneira pela qual se relaciona com a prática. (p.515)
Logo, é possível concluir que o objetivo da teoria educacional é guiar as práticas dos educadores, dando indicativos de que ações devem ser tomadas para resolver problemas, superar dificuldades.
As autoras do artigo fazem uma aproximação entre as abordagens de Carr e Kemmis, e de Barbier e Morin para compreender melhor a pesquisa-ação atualmente, principalmente na área da educação:
Fazem crítica ao positivismo nas ciências sociais;
Recorrem a abordagens mais compreensivas para criar categorias interpretativas;
Vinculam pesquisa à mudança, transformação da realidade;
Investigam o conceito de pesquisa na ação e na prática;
Noção de totalidade afirmada na prática;
Pesquisa-ação é mais que uma abordagem, é um posicionamento diante de questões epistemológicas fundamentais (relação sujeito/objeto; teoria/prática; reforma/transformação social.
Ao discutir as armadilhas do praticismo, as autoras ressaltam que a pesquisa-ação não se trata de uma teoria contemplativa e abstrata. Não apenas compreender o mundo, mas também transformá-lo através das relações sujeito-objeto, teoria-prática.
Mas também é necessário que esta transformação da realidade não signifique a perda de mediações teóricas.
"O suposto de que a produção do conhecimento seja orientada para subsidiar a ação pode incorrer numa noção bastante pragmática de teoria, aquela que se orienta para um fim útil, o que viria a conferir-lhe um caráter de instrumentalidade ou, no limite, a sua negação como teoria. Não é demais lembrar que teoria e prática guardam entre si uma relação de contradição: mesmo sendo sempre e necessariamente vinculada à prática, teoria não é prática, não se reduz a esta e não pode orientar-se imediatamente pelo seu interesse." (p.515)
As autoras destacam que o praticismo pode afetar a formação inicial e continuada dos professores. O ideal de formação não pode ter como principio da ação o instrumentalismo/utilitarismo, e sim a estreita relação entre a ação e a teoria.
Aligeiramento da formação, banalização da pesquisa, descaracterização da universidade como instituição formadora de educadores, redução das condições de autonomia e rigor do exercício da crítica são alguns riscos do praticismo na educação elencados pelas autoras.
Logo, é importante estar atento ao excesso do praticismo que pode criar a falsa compreensão de que a pesquisa-ação tem como objetivo solucionar problemas isolados na escola ou na sala de aula.
Referência:
NUNES, Débora R. P.. Teoria, pesquisa e prática em Educação: a formação do professor-pesquisador. Educ. Pesqui., São Paulo , v. 34, n. 1, abr. 2008 . Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-97022008000100007&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 30 jun. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/S1517-97022008000100007.
Na
aula do dia 11/04 tivemos a presença da Eliane Gomes da Silva apresentando sua
tese de Doutorado em Educação intitulada Movimento e educação infantil: uma
pesquisa-ação na perspectiva semiótica.
A
apresentação da parte metodológica de seu trabalho me instigou a pesquisar mais
profundamente sobre a pesquisa-ação. Nesta postagem, pretendo fazer um paralelo
das definições e importância desse procedimento baseando-me principalmente no
trabalho de Eliane e no material intitulado "Métodos de
Pesquisa" (2009). Para facilitar a leitura, o farei em forma de tópicos.
Os
tópicos a seguir são uma tentativa de resumir trechos que considero importantes
para o entendimento da Pesquisa-ação retirados da tese de Eliane.
- Em sua
tese, Eliane relembrando Pereira (1998) nos mostra que a pesquisa-ação em
Educação surgiu em 1960 "como uma tentativa (dos acadêmicos) de superar as
lacunas existentes entre o ensino e a pesquisa, e de resolver o problema da
relação entre teoria e prática" (2012, p. 51).
- Todas as
correntes nessa perspectiva "envolvem um plano de ação baseado em
objetivos, em um processo de ação planejada e no relato concomitante desse
processo." (2012, p. 51).
É ainda "no
decorrer e nas direções apontadas por acontecimentos gerados no próprio
processo da pesquisa-ação que as ações devem ser repensadas, replanejadas e
modificadas". (2012, p. 51).
- Para Silva
(2012, p. 52) "A investigação-ação é concebida como meio de descobrir
hipóteses cuja comprovação pode conduzir ao aperfeiçoamento da prática e servir
como uma rota alternativa para a geração da teoria".
- Baseando-se Pereira
(1998) Eliane (2012) entende a investigação-ação como "um processo que se
modifica continuamente em espirais de reflexão e ação e que, ao invés de
limitar-se a utilizar um saber existente (o que caracterizaria a pesquisa
aplicada), busca mudanças no contexto concreto e estuda as condições e os
resultados da experiência efetuada". (p. 53)
- Enfatiza ainda
que "uma pesquisa-ação pode ter objetivo voltado para a produção de conhecimento
que não seja útil apenas para a coletividade considerada na investigação local,
mas conhecimento passível de ser cotejado com outros estudos e suscetível de
generalizações parciais, no âmbito educacional, por exemplo. Nesse caso, a
ênfase pode ser dada a um ou mais dos seguintes aspectos: resolução de
problemas, tomada de consciência ou produção de conhecimentos". (2012, p.
54)
- Conforme as palavras
de Eliane (2012), esse tipo de procedimento deve ter como princípio
"a importância da parceria/diálogo para desenvolvimento do trabalho, o
interesse em modificar condições sociais estabelecidas e a necessidade de
reorganização contínua da pesquisa-ação no decorrer de seu processo". (p.
54)
- Apoiando-se em Contreras Domingo
(1994), Eliane (2012) entende que "tal procedimento metodológico fica
entendido como o estudo de nossas próprias práticas e não das práticas dos
outros, do que eles fazem". (p. 55)
Para finalizar, coloco a
contribuição dos autores Thiollent (1988), Fonseca (2002) e Gil (2007) sobre a
pesquisa-ação que pode ser encontrado no material intitulado "Métodos de
Pesquisa". Nesse material é possível encontrar tudo sobre pesquisa
científica, desde o tema à escolha de instrumentos e técnicas. Por essas e
outras contribuições, recomendo sua leitura.
- Thiollent (1988) aponta que:
A
pesquisa ação é um tipo de investigação social com base empírica que
é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com
a resolução de um problema coletivo no qual os pesquisadores e
os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou
participativo.
- Conforme a observação de Fonseca
(2002)
A
pesquisa-ação pressupõe uma participação planejada do pesquisador na
situação problemática a ser investigada. O processo de pesquisa recorre
a uma metodologia sistemática, no sentido de transformar as realidades
observadas, a partir da sua compreensão, conhecimento e compromisso
para a ação dos elementos envolvidos na pesquisa (p. 34). O objeto da pesquisa-ação
é uma situação social situada em conjunto e não um conjunto de variáveis
isoladas que se poderiam analisar independentemente do resto. Os dados
recolhidos no decurso do trabalho não têm valor significativo em si,
interessando enquanto elementos de um processo de mudança social. O
investigador abandona o papel de observador em proveito de uma atitude
participativa e de uma relação sujeito a sujeito com os outros parceiros. O
pesquisador quando participa na ação traz consigo uma série de conhecimentos
que serão o substrato para a realização da sua análise reflexiva sobre a
realidade e os elementos que a integram. A reflexão sobre a prática implica em
modificações no conhecimento do pesquisador (p. 35).
- Já para Gil
(2007, p. 55), a pesquisa-ação tem sido alvo de controvérsia devido ao envolvimento
ativo do pesquisador e à ação por parte das pessoas ou grupos envolvidos no
problema. Apesar das críticas, essa modalidade de pesquisa tem sido usada por
pesquisadores identificados pelas ideologias reformistas e participativas.
Abraços,
ANA LAURA
Referências:
GOMES-DA-SILVA,
E.A construção metodológica.
In:______. Movimento e educação infantil:
uma pesquisa-ação na perspectiva semiótica. 2012.Tese ( Doutorado em Educação)
- Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012. Cap.2, p.
51 a 59.
Métodos de
pesquisa / [organizado por] Tatiana Engel Gerhardt e Denise Tolfo Silveira;
coordenado pela Universidade Aberta do Brasil – UAB/UFRGS e pelo Curso de
Graduação Tecnológica – Planejamento e Gestão para o Desenvolvimento Rural da
SEAD/UFRGS. – Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009.
A
formação dos professores, a partir da LDB 9394/96, passou a ocorrer no Ensino
Superior para a docência na primeira Etapa da Educação Básica, também foi
admitida como formação mínima, de nível médio, a modalidade normal. Mesmo em um
ambiente confuso de definição, o curso de Pedagogia tornou-se a principal fonte
de formação para atuação na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino
Fundamental.
A
suspeita é que, entendida, como em tempos passados, mais como uma contemplação
da formação do professor dos primeiros anos do Ensino Fundamental, a formação
oferecida não considere devidamente as especificidades da educação das crianças
na pré-escola e nas creches. (GATTI; BARRETO, 2009, p. 258).
Como resultado das Novas Diretrizes
Curriculares para o Curso de Pedagogia, os cursos remanescentes foram
reorganizados com o objetivo de atender a legislação em vigor. Algumas
alterações ocorreram na prática, como a extinção das habilitações, a base de
formação na docência e ainda adequação para uma formação abrangente. Essa
legislação impõe ao Curso de Pedagogia uma distorção quanto ao entendimento de
docência e pedagogia.
Diante
do que foi elucidado, admiti-se que as decisões tomadas na área das políticas
públicas, como a Resolução CNE/CP 1/2006, podem colocar em risco a criação da
profissionalidade docente no que refere à Educação Infantil, uma vez que não
contribui para a formação dos profissionais dessa etapa.
Galdi da Silva (2011) investigou a formação inicial
para professores de educação infantil e indicou avanços, impactos e desafios
postos aos profissionais da Educação Infantil e às políticas públicas voltadas
para infância, bem como caracteriza limitações impostas aos Cursos de Pedagogia
pela Resolução CNE/CP 1/06, no que se refere ao aligeiramento e precariedade.
Nesse sentido defendemos uma proposta
de formação por imersão que poderia ocorrer nos estágios contemplando os
projetos dos Cursos de Pedagogia, numa parceria com as demais disciplinas e com
as instituições de educação infantil. Para isso, nos apoiamos em Azanha (1995)
que considera a educação como tema político e, ainda, por admitir que as
reformas ocorrem nas salas de aula. Dessa forma, precisamos considerar na
formação inicial e continuada os sujeitos envolvidos porque Azanha (1995, p.
76) nos alerta que “[...] a formação do professor e o seu próprio
aperfeiçoamento completam-se com o êxito que ele tenha na assimilação desse
saber difuso e historicamente sedimentado no ambiente escolar e que tem apenas
tênues relações com teorias pedagógicas”.
Como
decorrência dessa proposta, sugerimos a realização de projetos de formação e de
supervisão, cuja intencionalidade é uma formação integrada à futura prática
profissional. Trata-se de ação colaborativa entre a supervisão, as
universidades e as instituições de Educação Infantil para a realização de
formação dos profissionais de Educação Infantil, tanto a inicial quanto a
continuada.
Essa proposta, apesar de
aparentemente utópica, tem possibilidades de ocorrer na medida em que nos
relacionamos com o saber e atribuímos uma função social e de sentido com as
expectativas sobre a educação das crianças pequenas e as funções das
instituições de educação infantil e de seus profissionais.
A realização de um mapeamento
cultural da escola conforme proposto por Azanha (1995, p.74) poderia contribuir
com a implantação, cujo objetivo seria compreender a dinâmica da escola e entender
o que acontece no interior destas.
Freire (2000) afirma que não
docência sem discência e aponta que existem saberes indispensáveis a prática
docente, que devem ser discutidos e analisados na formação. Desse modo, cabe
aos formadores criarem possibilidades para construção de tais saberes, aguçando
a curiosidade epistemológica e utilizando da capacidade crítica.
Neste
sentido, a reflexão
é extremamente importante porque possibilitará a categorização e a análise destes
saberes como signos num pensamento tríadico, em busca de uma compreensão lógica
da educação infantil brasileira considerando suas nuances e com possibilidades
para romper com as crenças e hábitos existentes.
Essa proposta de formação que busca
articular a formação inicial e continuada com a participação de formadores
preocupados com a construção de saberes tanto dos professores em exercício quanto
dos futuros professores a partir da realização do mapeamento cultural da escola
para entender a dinâmica da escola e acenar com perspectivas para que a
educação infantil enfrente a crise atual.
A antropologia é a ciência que se dedica estudar o comportamento humano em sociedade e compreender suas especificidades, principalmente os significados das relações e das interações entre os indivíduos de um determinado grupo. Para compreender os símbolos e seus significados é preciso que o antropólogo tenha o domínio do método etnográfico o qual tem como princípios a observação participante, isto é, para compreender como o outro pensa e sente é preciso se colocar em seu lugar, vivenciar sua experiência.
A semiótica de Peirce é a ciência dos signos, isto é, tudo é signo, pois tudo se relaciona e ao se relacionar produz significantes e significados, é preciso compreender a teia de relações que se estabelecem entre os diferentes sujeitos e objetos para compreender os diferentes significados que se estabelecem.
É possível pensar a etnografia como um instrumento de extrema importância para compreendermos essas relações e os diferentes significados que se estabelecem no âmbito da educação em geral e da escola em específico? Qual a importância da antropologia no âmbito da semiótica? Quais os pontos positivos e negativos na aproximação dessas duas teorias?
quinta-feira, 26 de junho de 2014
A
pesquisa-ação em educação
A
fim de colaborar com o entendimento da proposta da pesquisa-ação compartilho um
estudo desenvolvido por Molina (2007) que objetivou fazer um mapeamento da
produção da pesquisa-ação em educação no Brasil no período de 1966 a 2002,
partindo da análise dos bancos de dados de teses e dissertações dos PPGE
reconhecidos pela CAPES em nosso país. Para não me estender, focarei em
aspectos conceituais apresentados pelo autor, bem como na importância da
pesquisa-ação no ambiente escolar, a ser realizada com professores.
De
acordo com o autor, a pesquisa-ação estimula a aproximação entre o pesquisador
e o(s) sujeito(s) pesquisado(s), por meio da colaboração em processos
investigativos desenvolvidos COM, PARA e PELOS indivíduos.
A
título de exemplo, na área do trabalho infantil, autores como Alves-Mazzotti
(2002), Liebel (2003), Martinez (2001), Sarmento (2005) e Woodhead (2004),
buscam desenvolver suas pesquisas a partir dessa relação entre pesquisador e
pesquisado, a fim de se obter aspectos da subjetividade do participante, mais
condizentes com seu ponto de vista acerca do fenômeno em estudo.
Para
Molina (2007), a pesquisa-ação realizada no interior das escolas, com os
professores, pode desenvolver mudanças significativas no seu processo ensino-aprendizagem,
partindo de uma concepção de que os professores produzem teorizações no seu
contexto diário que os auxilia a superar a visão de apenas técnico, executor
daquilo que outros decidem. Para ele, o professor estaria em situação
privilegiada para participar de pesquisas, porque é ele que sente e conhece os
problemas da escola.
A
pesquisa-ação valoriza a imersão consciente no contexto observado, tanto pelo
pesquisador como pelo sujeito participante, contribuindo para uma mudança na
prática e atuação deste e para a observação e coleta de dados significativos
para aquele, que talvez não pudessem ser obtidos com outros instrumentos e
técnicas. Nas pesquisas sobre o trabalho infantil esta proposta auxilia o
pesquisador a entender a subjetividade do sujeito trabalhador para além de
discursos generalizantes negativos ou definições que implicam na dignidade do
trabalho: é possível verificar os fatores que implicam para concepções
negativas e/ou positivas suscitadas pelos participantes.
Tal
proposta de atuação da pesquisa-ação também aproxima a universidade da escola.
Contribui para que haja uma troca de experiências entre os saberes acadêmicos e
aqueles produzidos no chão da escola: ouvir os professores e produzir
conhecimentos a partir do ponto de vista dos próprios, estudando a realidade em
que se encontram e contribuindo para modifica-la com a transformação de
sujeitos autônomos e “criadores” do ambiente em que vivem.
Referências
ALVES-MAZZOTTI, A. J. Repensando algumas questões sobre o
trabalho infanto-juvenil. Revista Brasileira de Educação, n. 19, 2002, p.
87-98.
LIEBEL, M. Working children as social subjects:
the contribution of working children‘s organizations to social transformations.
Childhood, n.10, 2003, p. 265-285.
Martinez,
A.M. (2001). Trabajo infantil y subjetividad: uma perspectiva necesaria. In:
Estudos de Psicologia, 6 (02),
UFRN, Natal.
MOLINA, R. A pesquisa-ação/investigação-ação no Brasil: mapeamento da produção
(1966-2002) e os indicadores internos da pesquisa-ação colaborativa. São Paulo:
FEUSP, 2007, 177 p.
SARMENTO,
M. J.Trabalho Infantil em Portugal: Controvérsias e
Realidades. In: VIEIRA, C. et al. Ensaios
sobre o Comportamento Humano. Coimbra: Almedina, p. 95-116, 2005.
STROPASOLAS, V. L. Trabalho Infantil no campo: do
problema social ao objeto sociológico. Revista
Latino-Americana de Estudos do Trabalho, ano 17, nº 27, 2012, p. 249-286.
WOODHEAD, M. Combating child labor – Listen to what
children say. Childhood, v.6, 1999, p.27-49.
quarta-feira, 25 de junho de 2014
O método de
pensamento lógico de Charles Peirce: aproximações
Vera Luísa de Sousa
Temos estudado o
método pragmaticista de Charles Peirce cujo “[...] único objetivo é tornar
nossas ideias claras a partir daquilo que estamos em contato a todo tempo, i.
é., a partir dos significados que afetam a nossa conduta.” (COSTA, 2011, p.22).
Pierce propõe esse método lógico de pensamento e de análise dos conceitos como
aquele capaz de eliminar toda ideia que não seja verdadeira porque busca a
verdade por entre o objeto e o seu
significado. O Professor Mauro Betti sempre nos adverte que a chave para que
possamos compreender a semiótica e o método científico de Pierce é a expressão por entre. Ou seja, o significado do
objeto pode ser vislumbrado na experiência ou “[...] no fluxo cognitivo em que
a experiência está envolvida [...]” (ibid., p.23). Construímos conhecimento na
experiência vivida com o uso do método lógico que nos ajuda a entender a
estrutura própria dos objetos que desejamos conhecer. Assim, a experiência vívida
o “quase ser” (primeiridade) torna-se consciência do outro (secundidade) por
meio da experiência mediadora que formula o conceito (terceiridade).
Dito de outro
modo, o método pragmaticista de Charles Peirce é um método de análise que parte
da inquirição do objeto mediada pela experiência para determinar o verdadeiro
sentido de um conceito, mediante a fixação da crença pelo hábito. Como afirma
Costa (2011, p.26)
A crença em
Peirce é um estado de estabilidade seguro, que cria hábitos internos, que nos
levam a agir quando apresentada uma situação em que o hábito é ferido. O hábito
no pensamento de Peirce é caracterizado como a fixação da crença, pelo qual
estamos apoiados, e que a todo tempo é testado de forma voluntária e
involuntária, justamente porque não é necessariamente a crença que nos leva a
agir, mas sim, a constante manutenção da crença pelo hábito.
Nesse
sentido, diante de situações desestabilizadoras que nos colocam dúvidas agimos
pautados pela ideia de segurança que encontramos na crença, um estado de
estabilidade e conforto que nos permite agir em busca de sua permanência.
Assim, a dúvida é o móbil que nos conduz a buscar, pela inquirição, a segurança
da crença instigados pelo hábito do qual não desejamos nos desvencilhar, mas
manter como garantia da nossa segurança.
Entender
a relação dúvida-hábito-crença é um modo de aproximação do método de pensamento
de Peirce que procura conhecer o significado do conceito que se estabelece na
relação objeto-hábito porque, para o pragmatismo, a finalidade do pensamento é
a ação e o fim de toda ação é um novo pensamento. Assim, conhecer o significado
do conceito é fundamental para que se possa conhecer também seu propósito
imediato e prático ou o modo como afetará a conduta originando nova crença.
Olá pessoal tudo bem
com vocês? Fiquei pensando o que postaria no blog como minha segunda
participação, pois na primeira procurei compreender um pouco do que vimos sobre
a semiótica em uma perspectiva mais educacional e em específico para a Educação
Especial.
Foi então, que seguindo
um caminho lógico de compreensão e sentidos para mim, resolvi postar algumas
reflexões sobre Bernard Charlot, ainda na perspectiva antropológica do saber.
Por isso, escolhi um dos textos vistos em aula que foi o Cápitulo 4: O “filho
do homem”: Obrigado a aprender para ser (uma perspectiva antropológica) que
se divide em duas partes, sendo que na primeira reflete-se sobre a educação
como um longo processo de construção e reprodução de si próprio, e na segunda
de forma muito breve a questão da mobilização e do sentido para Charlot.
1.Nascer é estar submetido à
obrigação de aprender
Aqui a primeira ideia
que o Charlot traz é exatamente a mesma que o Paulo Freire também estabelece,
que é a ideia de que somos seres inacabados e por isso em constante aprendizado.
Nas palavras do texto, Charlot elucida: “o
essencial já está aí: o homem não é, deve tornar-se o que deve ser; para tal,
deve ser educado por aqueles que suprem sua fraqueza inicial e deve educar-se,
“tornar-se por si mesmo”. Ou seja, assim como, para Freire somos seres
inacabados e temos que ter a consciência do inacabamento.
Também traz a ideia de
que a essência humana não é uma abstração inerente ao indivíduo considerado à parte.
Em sua realidade, é o conjunto das relações sociais, ou seja, Charlot quer
dizer que a essência originária do indivíduo humano não está dentro dele mesmo,
mas, sim, fora, em uma posição excêntrica, no mundo das relações sociais e a
EDUCAÇÃO é essa apropriação, sempre parcial, de uma essência excêntrica (âmago
das relações sociais) do homem.
Nessa ideia, Charlot
trabalha a questão do APRENDER para construir-se, em um triplo processo de
“hominização” (tornar-se homem), de singularização (tornar-se um exemplo único
de homem), de socialização (tornar-se membro de uma comunidade, partilhando
seus valores e ocupando um lugar nela). Ele diz que uma pessoa ao nascer, nasce
submetido à obrigação de aprender que significa entrar em um conjunto de
relações e processos que constituem um sistema de sentido, onde se diz quem eu
sou, quem é o mundo, quem são os outros.
Assim, Charlot traz a
ideia da educação como um longo processo de construção e reconstrução que nunca
acaba. A educação é uma produção de si por si mesmo, mas essa autoprodução só é
possível pela mediação do outro e com sua ajuda. A educação é o processo
através do qual a criança inacabada se constrói enquanto ser humano, social e singular.
Acredito que o ponto
chave desse tópico é que a educação não é socialização de um ser que não fosse
já social: o mundo, e com ele a sociedade, já está sempre presente. “A educação é produção de si próprio”.
Essa produção assim
como chama Charlot funciona como um processo que se desenvolve no tempo e
implica atividades, mas para haver atividade a criança deve mobilizar-se e para
que isso ocorra deve existir um significado. Assim, Charlot esclarece três
conceitos: mobilização, atividade e sentido.
2.Mobilização, atividade, sentido:
definição de conceitos
Mobilização: Mobilizar
é por recursos em movimento. Mobilizar-se é reunir suas forças, para fazer uso de si próprio como recurso. Nesse
sentido a mobilização é ao mesmo tempo preliminar, relativamente à ação e seu
primeiro momento.
Atividade: Atividade é
um conjunto de ações propulsionadas por um móbil (razão de agir) e que visam a
uma meta.
Então, a criança
mobiliza-se, em uma atividade, quão investe nela, quando faz uso de si mesma
como de um recurso, quando é posta em movimento por móbeis que remetem a um
desejo, um sentido, um valor.
Sentido: “Significar é sempre
significar algo a respeito do mundo, para alguém ou com alguém”. Tem
“significação” o que tem SENTIDO, que diz algo do mundo e se pode trocar com
outros. Que será o sentido, estritamente dito? É sempre o sentido de um
enunciado, produzido pelas relações entre os signos que o constituem, signos
esses que têm um valor diferencial em um sistema.
Ou seja, o sentido é
produzido por estabelecimento de relação, dentro de um sistema, ou nas relações
com o mundo e com os outros.
Lembrando que para
Charlot esse sentido é um sentido para alguém, que é um sujeito.
Assim, Charlot utiliza
o autor Leontiev para esclarecer que o sentido de uma atividade é a relação
entre sua meta e seu móbil, entre o que incita a agir e o que orienta a ação,
como resultado imediatamente buscado.
O objetivo dessa postagem é ajudar as pessoas
que, assim como eu, encontrou dificuldades para entender a semiótica. Sabe-se
que alguns conceitos são básicos para o seu entendimento, por isso resolvi
postar esse vídeo que, apesar de curto, traz os conceitos fundamentais para o
seu entendimento de forma simples, porém esclarecedora, além de exemplos que
facilitam ainda mais o entendimento. Assim, sugiro que resgatemos as aulas
anteriores (textos e explicações do professor, bem como dos convidados) e
façamos uma relação com o vídeo.
O vídeo traz definições como:
-
O que é semiótica?
-
Qual é sua importância
-
Signo
-
Representamen
-
Objeto
-
Interpretante
-
Icone
-
Índice
-
Símbolo
A seguir o link: "Semiótica para todos (o que é semiótica)"
Antes de mais nada, convém reconhecer minha dificuldade quanto a
temática semiótica de Peirce, pois, sou
oriundo da ciência da computação e administração. A medida que recebia as pacientes
explicações do Prof. Mauro e contribuições dos demais colegas, as primeiras relações que estabeleci não foram com a ciência da computação ou administração,
ma sim, com a filosofia das artes marciais japonesas ou Budô, uma vez que as tenho
praticado desde a infância, entre as quais destaco especificamente o Karate. É
com base na filosofia do Karate que escrevi este primeiro comentário (evidentemente, sujeito a erros) a respeito
da análise fenomenológica do estado da "mente vazia" (termo utilizado
nas artes marciais para descrever o estado em que não se faz nenhuma projeção
mental do tipo "... se o adversário fizer isso, então, farei
aquilo...".), que entendo com sendo um signo semiótico, capaz de possibilitar ao Karate-Ka (praticante de
Karate) colocar-se em posição de combate e superar a tensão pré-combate.
É importante lembrar que o Karate é uma arte marcial estruturada
em um sistema de autodefesa (com e sem armas), desenvolvido por volta do século
XIII e XIV no antigo reino Ryu Kyu (atual distrito de Okinawa, Japão), como
parte do treinamento e do arsenal militar da guarda real. No entanto,
atualmente, muitas destas
características militares originais se perderam no tempo.
Para o aprendizado e prática do Karate, Nakayama (1983) e Gichin
Funakoshi (aluno e professor, respectivamente, idealizadores do Karate moderno),
destacam dois pontos. O primeiro refere-se ao elemento técnico, sobre o qual
julgam ser necessário dedicar grande empenho no aprendizado a ponto de torná-lo
um modelo de referência, a partir dos quais, outros elementos técnicos podem
ser expandidos. O segundo refere-se ao aprendizado pela experiência e não pela
teoria. Segundo Funakoshi (1998), não se pode aprender Karate somente por meio
das palavras (ou de teorias) e, sim, com o próprio corpo; com a prática. Tal
noção faz referência ao Zen Budismo que, ocasionalmente, é considerado como
sendo um modo de vida, mais do que uma doutrina espiritual (Gardini, 1998) e
também nos conduz a John Dewey (1959) com o aprendizado por meio da
experiência.
O Karate moderno encontra-se organizado de maneira sistematizada
para que o aprendizado seja gradual, em nível crescente de dificuldade, onde os
obstáculos possam ser superados um por vez, passando-se então a obstáculos de
outras naturezas. Este "Karate Moderno" (um novo signo) do qual
Nakayama se refere nada tem a ver com o "Antigo Karate" (signo
anterior) do reinado Ryu Kyu idealizado para matar ou causar sérios danos
físicos ao oponente. No entanto, os fundamentos e as técnicas são as mesmas.
Desta forma, o aprendizado enfatiza, inicialmente, os fundamentos
e as técnicas básicas (chamadas "Kihon") possibilitando o
desenvolvimento, aperfeiçoamento e domínio dos movimentos, observando a busca
pelo controle consciente da utilização dos músculos, considerando a sua
expansão e contração. Entretanto, este controle consciente necessita ser superado
e deve ter fim. Assim, quando aquele que aprende torna-se capaz de interpretar
a técnica, novos signos são criados.
No vídeo a seguir pode-se ver o professor Massao Kagawa expondo
os detalhes das técnicas básicas de chutes:
E neste outro vídeo, produzido pelo Discovery Channel, na
primeira parte pode-se observar o Professor Kiyohide Shinjo demonstrando
técnicas de controle, força e precisão (denominadas de
"Tameshiwari"):
Assim, após o domínio das técnicas passa-se ao aprendizado das
táticas e, em seguida, das estratégias (Tais táticas e estratégias são
codificadas em formas conhecidas como "Kata"), o que pode ser visto
neste vídeo do Professor Didier Lupo:
Nakayama explica que o principiante não sabe se posicionar para
o combate, pois, sua mente esta em constante conflito (em como articular o seu
pequeno arsenal técnico com a situação desconhecida e dinâmica do combate). Se
for atacado, ele pode até reagir, mas sem nenhuma estratégia. Desta forma,
quando tentar reagir ou golpear, pode vacilar e se atrapalhar, como pode ser
observado exemplo do vídeo a seguir:
A medida que aprende a usar as técnicas e as posturas ele passa
a conhecer e reconhecer as situações de combate e sua atenção é desviada poroutros aspectos.Entretanto, com mais
treino ele passa a aplicar as técnicas e posturas sem que haja a necessidade de
um esforço consciente, retomando o estágio de principiante (de não saber o que
fazer conscientemente - a mente vazia), com desapego, livre de obstáculos e o
movimento apropriado para cada situação torna-se possível. Neste estágio, o
movimento ou reação apenas "flui" e "acontece". A figura 1
mostra o exato momento em que Francisco Filho, atleta brasileiro, primeiro
ocidental a vencer um campeonato mundial de Karate (sem divisão de pesos),
aplicando o golpe "Mawashi-geri" (chute semi-circular) em Andy Hug (vice-campeão
mundial e figura lendária nos esportes de combate), levando-o a knockout em 1991 ou nos termos
competitivos, aplicou um Ippon ou
Golpe perfeito, que tornou-se um ícone
(na semiótica) entre os praticantes da modalidade.
Figura 1 - Um ícone: Francisco Filho (Brasil) leva Andy Hug (Suiça) a knockout no mundial de
1991
Percebe-se, então, que o ato de lutar (chamado de
"Kumite") pode ser considerado um processo semiótico por envolver a
construção e interpretação de signos (processo de semiose), pois, trata-se de
um pensamento que envolve o signo, o seu objeto e seu interpretante. Este
processo ocorre durante todo o tempo da luta, sendo que cada Karate-Ka gera
significado ao interpretar a luta de acordo com o seu repertório técnico, com
seus objetivos e estratégias. Para melhor ilustrar, o vídeo a seguir mostra o
confronto completo entre Francisco Filho e Andy Hug, citado na Figura 1.
Aqueles que apreciam um confronto altamente técnico de Karate irão verificar os
elementos citados durante todo o texto e poderão visualizar a construção
dinâmica destes signos. Para os leigos, o momento exato capturado na Figura 1
ocorre aos 7:14m.
Com base neste último vídeo, pode-se fazer referência a Merrel
(2004, p.18-19), pois, ele explica que
Peirce oferece a possibilidade do pensamento triádico, como sendo, de fato,
não-linear, de modo que para cada par de opções sempre exista outra opção e
entre os pares de opções que ficam, outras opções sem fim. Para Merrel, isso
tem a ver com a concepção de Peirce das três categorias (Primeiridade,
Segundidade e Terceiridade) que explica como sendo, ao mesmo tempo, fácil
demais, mas talvez impossível demais. Fácil demais porque é tão simples quanto
começar do Zero e, em seguida, Um, Dois, Três e fim. E impossível demais porque
o Zero não quer dizer simplesmente "nada" (assim como o estado da
"mente vazia" citado no início deste texto); quer dizer também que a
partir do "nada" a possibilidade da emergência, da criação de tudo
que houve, que há e que deverá haver no universo inteiro.
Como Karate-Ka, entendo que o chute da Figura 1 não foi
planejado e simplesmente aconteceu, não sendo obra do acaso. Todos os elementos
anteriormente citados, como treinamento exaustivo, aprendizado por fases, em
diferentes níveis de dificuldades, fizeram com que, naquele exato momento, ele
(Francisco) pudesse criar este signo. Após a aprendizagem das habilidades
técnicas fundamentais, o Karate-Ka experiente avança para outros estágios da
prática e pode lutar. Isso compreende o aperfeiçoamento das noções de
distância, velocidade, táticas e estratégias. A prática da luta (Kumite) pode
ter início como método de aprendizagem. Neste contexto, obstáculos
anteriormente superados serão postos à prova e quanto menos a mente se ocupar
deles, mais rápido chegará a uma instância mais profunda, o que é chamado de
"sexto sentido do ataque e da defesa" (Nakayama, 1978). Tal concepção
só pode ocorrer com a libertação espontânea que o treinamento gradual possibilita
(o Zero definido no modelo triádico de Peirce). Como enfatiza Nakayama (1978):
Não importa como a pessoa executa as técnicas que praticou. Se sua mente
estiver apegada em como executar as técnicas, não conseguirá vencer. É
fundamental, no treinamento, que a mente não se fixe, quer nos movimentos do
adversário, quer no ato de golpear ou de bloquear. É necessário que sua mente
esteja no estado "Vazio".
Merrel (2004, p.30) aponta que o modelo triádico, na Figura 2,
resiste a distinção entre corpo e mente e sujeito e objeto, pois, abrange
interconexões de interdependência, inter-relacionada e interação entre corpo e
mente, como entidades unificadas, são corpomente,
o que quer dizer que há aprendizagem e conhecimento explícitos e tácitos que
misturam corpo e mente.
Figura 2 -
Modelo Triádico de Peirce
Fonte:
Merrel, 2004, p. 18
Assim, como ressalta Merrel (2004), o corpormente aprendeu a fazer o que faz sem a necessidade de
intervenção da mente; faz em níveis de conhecimento tácito em lugar de ser
focalizado pela mente ativa. É assim também que se faz na prática do Karate!
REFERÊNCIAS
BARREIRA, C. R. A. & MASSIMI, M. O Combate Subtrativo: A
Espiritualidade do Esvaziamento como Norte da Filosofia Corporal no Karate-Do.
Psicologia: Reflexão e Crítica, 21(2). 2008. p.283-292.
FUNAKOSHI, G. Karate-do Nyumon: Texto introdutório do Mestre (E.
L. Calloni, Trad.). São Paulo, SP: Cultrix. (Original publicado em 1988). 1998.
GARDINI, W. Japon entre mitos y robots: el shinto. Buenos Aires,
Argentina: Sekai. 1998.
MERREL, F. A prática do pragmatismo: aprender vivendo, viver
aprendendo. In: TREVISAN, A. L.; ROSSATTO, N. D. (Orgs.).Filosofia
e educação: confluências. Santa Maria: Ed. FACOS/UFSM, 2004. p.
12-47.
NAKAYAMA, M. O melhor do karate 3: Kumite 1 (D. C. R. Delela
& S. N. Ferreira, Trads.). São Paulo,
SP: Cultrix. 1978.
NAKAYAMA, M.
Conversations. In R. G. Hassel. Conversations with de Master: Masatoshi
Nakayama. Philadelphia, PA: International Shotokan Karate Federation. 1983.