Partindo
de uma visão ampla e universal, a escola na maioria das vezes é vista, como um
lugar de aprendizagem. Um ambiente que é frequentado por crianças, jovens e
adultos, que buscam aprender coisas que não sabem, um espaço em que se passa do
"não saber para o saber".
Entretanto, o ambiente escolar não
pode ser considerado como o único local que oportuniza a esses indivíduos tal
movimento, pois sabemos que existem inúmeras maneiras de se apropriar do mundo,
portanto, muitos modos de aprender, assim como "muitas coisas para aprender". Aprender apresenta diversos
significados. Para Charlot (2000), aprender pode ser: adquirir um saber
(conteúdo intelectual), dominar um objeto ou uma atividade, entrar em formas
relacionais. Nesse sentido, aprender vai além do que o saber, uma vez que
existem diversas maneiras de aprender, assim como muitas coisas a serem
apreendidas, sendo que o "saber como
conteúdo intelectual" é apenas uma delas.Sendo assim, o indivíduo, na
tentativa de se apropriar do saber, estabelece múltiplas relações de
aprendizagem com o mundo, das quais a intelectual é apenas uma.
De acordo, com Charlot (2000), qualquer
tentativa de definição de um puro sujeito de saber, ou seja, de um sujeito que
se dedica ou tem a pretensão de dedicar-se à busca do saber, demanda que seja
levado em consideração outras dimensões do sujeito, como a sua dimensão
antropológica, psicológica e sociológica. Do mesmo modo que, na tentativa de
definição do saber, é necessário
levar consideração um sujeito que estabelece
múltiplas relações de aprendizagem com o mundo, dentre as quais está
presente a relação com saber. Nessa
perspectiva, a "relação com o
saber" é um contorno mais específico da "relação com o aprender", isto é, a "relação com o saber" é um tipo de relação que se estabelece com o
mundo, ao lado de outros caminhos possíveis. Para Charlot:
“[...] procurar o saber
é instalar-se num certo tipo de relação com o mundo; mas tem outros. Assim, a
definição do homem enquanto sujeito de saber se confronta à pluralidade das
relações que ele mantém com o mundo” (CHARLOT, 2000, p.60).
Para compreender o "sujeito de saber" se faz necessário
"apreender sua relação com o
saber", uma vez que, ao manter uma relação específica com o mundo,
este indivíduo está também em movimento com outras relações, que são relações
com o mundo, consigo mesmo, com os outros, com a linguagem e com o tempo
(CHARLOT,2000).
Se o saber é uma forma de relação
que se estabelece com o mundo, consigo mesmo, com outros sujeitos, com a
linguagem (símbolos) e com o tempo, fiquei me questionando, sobre qual seria a
função do processo pedagógico que ocorre na escola? Acredito que o processo pedagógico
deveria dar importância pela produção das condições de possibilidade que
permitiram ao sujeito o "movimentar-se"
no processo de educação intelectual, que não é simplesmente a acumulação de
conteúdos intelectuais, mas estabelecer de fato uma relação de saber com o
mundo. Segundo Charlot (2000), isso resulta na tentativa compreender qual é o
tipo de relação com o mundo e com o saber que a criança deve construir, com
auxilio da escola, que leve em consideração o indivíduo na singularidade, o
mundo, os outros, a linguagem, o tempo e as formas de atividades.
Todavia, esse processo, não pode se
resumir apenas à dimensão cognitiva, didática ou identitária, uma vez que se
contempla ambas as dimensões. Podemos dizer, que é um processo que vai muito
além da aquisição de conteúdos intelectuais, ou seja, que se inscreve na
relação com diferentes figuras do aprender e do saber, assim como em diferentes
situações, espaços/locais, pessoas e momentos.
Nesse sentido, a relação com o saber
não se restringe apenas a uma relação cognitiva, mas uma relação social e
identitária, o que nos aponta uma necessidade de enfrentamento da problemática
educacional levando em consideração as situações extra/intra escolares. As
situações extra escolares revelam a
necessidade de reconhecer que os alunos, como sujeitos históricos e sociais,
estão envolvidos em várias situações de aprendizagem, que corriqueiramente
possuem uma lógica e dinâmica de leitura de mundo, muito distinta daquela da
escola. Por isso, é necessário buscar estratégias provocadoras de uma relação
com o saber escolar que os mobilize para a aprendizagem. Já as intraescolares
permitem entender, por que a relação com o saber inclui a relação com os
outros, dessa maneira, a escola não educa somente pelos conteúdos que ensina,
mas também pelas práticas que promove.
Desse modo a leitura produzida a
respeito da escola e da sua relação com o saber e com o aprender, procura
mostrar que o grande diferencial da escola esta naquilo que ela pode fazer pela construção do ser humano, que
não se restringe apenas a educação intelectual, mas individual e social, isto
é, o processo de hominização, singularização e socialização. Nesse "triplo" processo de construção humana
não há espaço para a simples e limitada acumulação de conteúdos e classificação
entre os que aprendem e não aprendem, entre os que alcançam o sucesso e os que
sofrem o fracasso escolar, mas espaço para acreditar, com certa dose de segurança
na construção de relações de saber com o mundo, consigo mesmo e com os pares. A
relação de saber não é acumular, mas saber lidar significativamente e
efetivamente com o conhecimento historicamente construído para compreender,
refletir, escolher e agir melhor.
CHARLOT, Bernad. Da relação com o saber: elementos para uma
teoria. Porto Alegre: Artmed, 2000.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.