sábado, 12 de janeiro de 2013

A experiência vívida na Educação Infantil

           
Marisa Oliveira Vicente dos Santos

Ao encontrar-me com o livro Educação (Física) Infantil: a experiência do Se-Movimentar de Elaine Gomes-da-Silva senti-me impulsionada a compartilhar esta postagem a partir de experiências que tenho vivido na Educação Infantil.
            A autora, ao tratar do “mistério indesvendável” (Gomes-da-Silva, p. 24) de suas aulas em que as crianças participavam empaticamente numa relação que fluía de um modo diferente, nos leva a saber que tal mistério era o “fluxo do movimento expressivo” assim conceituado a partir da semiótica peirciana. O trabalho da autora/professora de Educação Física, na época chamado de “expressão corporal”, possibilitava o movimento como “experiência vívida” e foi posteriormente retomado a partir de uma “compreensão teoricamente fundamentada” com contributos da Educação Física, da Pedagogia, da Sociologia da Infância, da Fenomenologia e, especialmente, da Semiótica peirciana.
            Considerando que “... é necessário à Pedagogia da Educação Infantil proporcionar uma prática pedagógica em fluxo, restituindo, para tal, as singularidades/alteridades, de modo a contemplar uma prática pedagógica vívida” (p. 57) podemos nos permitir uma passagem por experiências comuns nas instituições de Educação Infantil. Ao tratar de tal tema meu pensamento é quase imediatamente atraído para as imagens dos bebês nas experiências do se-movimentar. Infelizmente ainda em muitas instituições as práticas pedagógicas tolhem os movimentos das crianças pequenas; berços, cercadinhos, espaços limitadores das experiências de um modo geral. Recordo-me de uma charge do Tonucci (1997, p. 29) em que um bebê aparece dentro de cercadinho segurando nas grades e olhando para o espaço externo com expressão de tristeza enquanto a mãe, ou adulta responsável, fala para alguém ao telefone “Você tem que ver como ele está feliz dentro do cercadinho com todos os seus brinquedos!”.
            Quando os movimentos das crianças não são tolhidos ainda assim, em geral, há grande dificuldade de compreender a criança em sua relação com o movimento, ou a criança em movimento, a criança e sua experiência de se-movimentar. Há também dificuldade de compreender a criança em sua singularidade, em sua condição de sujeito, em sua necessidade de interagir, relacionar-se, comunicar-se.
            Acredito que se tomarmos como tarefa específica possibilitar que as experiências das crianças na Educação Infantil sejam vívidas, a beleza e a consistência advindas da prática pedagógica serão indescritíveis. Utilizo o termo indescritível no sentido de que se diferenciarão em muito do “desequilíbrio” que ora “define a Educação Infantil, ou seja, a preferência unívoca, adultocêntrica e, ousamos dizer, ‘professorcêntrica’” (Gomes-da-Silva, p. 51). Experiências vívidas que no fluxo poderão ser interpretadas, analisadas, generalizadas; farão parte de uma produção científica da prática pedagógica na educação infantil. Ou serão simplesmente vividas com a intensidade necessária à condição humana em sua relação com todos os outros objetos e seres.
            Lembro-me de meu dia-a-dia na Educação Infantil em que partilhamos as experiências das crianças no se-movimentar: aventurar-se a agarrar um objeto, levá-lo à boca, mostrar aos outros a conquista com um largo sorriso nos lábios, rolar pela primeira vez e se assustar, tentar de novo, incomodar-se com o ficar de bruços e depois sentir prazer em movimentar-se nesta posição, chupar o dedão do pé com o maior gosto, desbravar os espaços dentro e fora das salas, descobrir a “cachoeira” do bebedouro e do lavatório do banheiro, ficar de pé e empurrar as cadeiras pelo pátio, subir e descer das cadeiras e mesas, fazer um barulhão com sua voz e depois ficar observando as reações produzidas, espetar pela primeira vez os alimentos com o garfo e gargalhar, andar e ver o mundo numa nova perspectiva se-movimentando pelas próprias pernas, gracejar sem fim na frente do espelho e dar um delicioso beijo na própria imagem... É sem fim... Isso porque o fluxo do pensamento levou-me aos bebês e quantos outros “sem fim” nas outras idades da Educação Infantil. Pareço ouvir o burburinho, as entradas constantes em minha sala com a pergunta “o que é isso?” para todos os objetos sobre a mesa, para os quadros, para qualquer novidade que se apresente, com as histórias contadas, com as outras perguntas feitas, com a associação dos símbolos que vêem em alguns papéis e a instituição em que estamos.
            Tenho a oportunidade de, no grupo de trabalho a que pertenço, presenciar muitas experiências vívidas com as crianças num processo em que os profissionais estão em processo de significação e fundamentação constante. No entanto, ainda nos deparamos com expectativas da sociedade na figura de famílias que levam essas crianças, às vezes, antes dos cinco anos, para instituições que oferecem o esperado trabalho de preparação para o Ensino Fundamental centrado em objetivos diferentes. Trata-se de um problema que merece uma abordagem ampla que não cabe nas intenções desta postagem.
            Compreendo que o modo de lidar com as experiências na prática pedagógica da Educação Infantil, a partir da perspectiva trazida por Gomes-da-Silva, ganha grande contribuição e provoca os professores a compreender a necessidade de provocar “as possibilidades expressivas das crianças .... mediante recursos multisensoriais (sonoros, imagéticos, táteis, verbais).

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