sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Resenha da Introdução do capítulo “As configurações da corporeidade na cultura do jogo: A cultura do jogo e a concepção peirceana” de GOMES-DA-SILVA, P.N. O jogo da cultura e a cultura do jogo: por uma semiótica da corporeidade. João Pessoa: Editora da Universidade Federal da Paraíba. 2011.


Por Claudinei Chelles

Nesse capítulo o autor demonstra sua preocupação com o sentido do movimento para o sujeito individual/cultural que o realizou e o significado de investigar sobre o estilo motor daquele que se movimenta. O que interessa é o movimento ou tendência geral dos gestos realizada no espaço-tempo existencial. Assim, a questão problema consiste em investigar “quais as configurações da corporeidade no mundo vivido”.

Sob essa perspectiva Gomes-da-Silva trata a corporeidade e o mundo vivido como aspectos muito importantes. A partir daí, ele transforma a questão-problema em questão de pesquisa para nortear a investigação. Então, “quais as configurações da corporeidade...”, se refere à figura que é formada pela sucessão de gestos. Observa-se que a corporeidade corresponde à forma como o corpo opera comunicação no mundo e com o mundo. Isso se constitui numa zona de comunicação criada pela condição de existência do homem, que se torna visível na realização dos gestos. O gesto é o objeto de investigação e a corporeidade é o que se busca descobrir.

A segunda parte da questão, “... no mundo vivido”, se refere ao lugar que as configurações se realizam. O mundo vivido constitui-se nas ações sociais realizadas nas interações dos sujeitos. Essas ações são cinéticas (movimento) ou posturais (variação da tensão muscular). Ou seja, são ações que produzem objetos de uso (vestuário, casa, por exemplo) e objetos culturais (moda, arquitetura,...), simultaneamente. Assim, para o autor os gestos humanos são criadores e criações de cultura. Pois a cultura não é o conjunto de objetos criados, mas uma ordem humana, uma construção provida de sentido e de significação, que orienta as ações dos indivíduos em sua vida social. A cultura é uma estrutura simbólica que organiza os valores e as significações.

O jogo como modalidade de ação social é escolhido para ser analisado por ele para identificar a configuração da corporeidade na cultura em que vivemos. É pelo jogo (lúdico) que a civilização surge e se desenvolve. “A cultura é um jogo”.

A questão-problema, a partir de agora se operacionaliza em duas questões de pesquisa referentes à qual a tendência dos gestos no jogo da cultura e qual a tendência dos gestos da cultura do corpo. O objetivo da investigação foi determinado pelo autor em como descobrir as configurações da corporeidade no jogo por meio da análise semiótica dos gestos. Ao afirmar que o mundo cultural é constituído pela proliferação de gestos que adquiriram novos significados, Gomes-da-Silva salienta que pelos gestos descobre-se a cultura e que o sentido do movimento não é apenas para o indivíduo que o realizou, mas para a cultura a que pertence.

O autor, ainda cita Merleau-Ponty (1994): “Não basta que dois sujeitos conscientes tenham os mesmos órgãos e mesmo sistema nervoso para que em ambos as mesmas emoções se representem pelos mesmos signos. O que importa é a maneira pela qual eles fazem uso do seu corpo, é a informação simultânea de seu corpo e de seu mundo na emoção”.

Sobre a cultura do jogo e a semiótica peirceana para o autor há pelo menos duas configurações da corporeidade em nossa cultura: “atiramento” e “poetante”. O poetante é a conduta motora. A questão de pesquisa nesse momento é: “Qual a tendência dos gestos na cultura do jogo?” Assim, o autor analisa os movimentos para descobrir-se o jogo. Há um lugar e um tempo específicos criados no ato de brincar, que não está separado do mundo. Então, surge a hipótese de que tal como na configuração poetante em que o eu lírico cria a beleza do poema, assim também os jogadores criam a beleza do jogo.

Nessa hipótese relaciona-se poesia e jogo como pertencentes ao acontecimento da corporeidade poetante. Além disso, em relação ao jogo, Gomes-da-Silva cita Freud (1908) mencionando que “ao brincar a criança se comporta como um poeta”. Ou seja, a ocupação favorita e mais intensa da criança é o brinquedo ou os jogos. Poderíamos dizer que ao brincar toda criança se comporta como um poeta, pois cria um mundo próprio, ou melhor, reajusta os elementos de seu mundo de uma nova forma que lhe agrade. A antítese de brincar não é o que é sério, mas o que é real. Apesar de toda a emoção com que a criança catexiza seu mundo de brinquedo, ela o distingue perfeitamente da realidade. O poeta faz o mesmo que a criança que brinca. Cria um mundo de fantasia que ele leva muito a sério, isto é, no qual investe uma grande quantidade de emoção, enquanto mantém uma separação nítida entre o mesmo e a realidade. A irrealidade do mundo imaginativo do escritor tem, porém, consequências importantes para a técnica de sua arte, pois muita coisa que, se fosse real, não causaria prazer, e muitas excitações que em si são realmente penosas, podem tornar-se uma fonte de prazer para os ouvintes.

Gomes-da-Silva ainda distingue os seguintes aspectos como relevantes para sua investigação:

Olhar do estudo: a cultura do jogo

A atenção para o jogo nesse momento não é psicológica, político-ideológico, histórico-sociológico, nem pedagógico. Apesar de serem dignas e necessárias.

Cultura peculiar do jogo – estrutura que ordena a ação com significado.

É necessário estudar a cultura do jogo, sua dinâmica peculiar, os vínculos emocionais criados pelos jogadores e investigar seus mistérios. Por isso, estudá-lo (o jogo) buscando interpretá-lo e compreendendo o contexto que ele ocorre, o espaço afetivo de seus gestos e a cultura que ele cria. É no jogo que a civilização surge e se reproduz.

Jogo como elemento de modelagem coletiva.

O jogo é um dos elementos agenciadores de modelagem do indivíduo e da coletividade, de acordo com o modo específico de organização da economia, sociedade e da cultura. O jogo modelo os sujeitos sociais tanto na estrutura do comportamento, quanto na sua subjetividade. Por ex: o controle de brinquedo pelos industriários tem a ver com o seu interesse de classe em fabricar não apenas brinquedos, mas comportamentos socialmente aceitáveis.

Jogo infantil: não é reprodução do mundo adulto.

Porém, o jogo infantil não é uma reprodução do mundo do adulto. Já que a criança, pelo seu brinquedo interage com o mundo. Brincando ela constrói simbolicamente sua realidade. Portanto, no jogo dois mundos complementam-se e confrontam-se ao mesmo tempo. Ao brincar a criança está situada socialmente e defronta-se com os vestígios da geração mais velha.

Jogo motor como estrutura sígnica.

A partir daqui, o autor pretende analisar a atividade motora, delineando essa forma de cultura em imagens com tons e perfumes. Essa análise não é só filosófica, histórica o psicológica, mas lúdica. Estudar a cultura do jogo é investigar a força do brincar que resiste à imposição do sistema social. Pesquisar esse espaço-tempo próprio significa conceber a estrutura do jogo como uma trama sígnica, que transcende as necessidades imediatas do cotidiano e confere um sentido de ação: “todo jogo significa alguma coisa”. Ao pressupor o jogo nesses termos a opção metodológica para ler essa cultura se dá através da semiótica.

Para analisar a tendência dos gestos na cultura do jogo, utiliza-se da abordagem semiótica que abrangesse o jogo motor como estrutura sígnica. Essa abordagem semiótica possibilita discutir qualquer signo, de qualquer espécie, decantando suas significações reais ou imaginárias. Assim, a análise ocorre através das categorias tricotômicas dos signos, possibilitando analisar o jogo mais minuciosamente, além de interpretá-lo em si mesmo.

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