quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

A mobilização para o saber e o ensino de leitura


A leitura dos textos de Bernard Charlot (1996 e 2000), levou-me a refletir sobre pesquisa que pretendo desenvolver neste curso de doutorado e sua relevância para a compreensão de processos de ensino e aprendizagem.

Ainda que eu não utilize as elaborações deste teórico para a realização da pesquisa, penso que quando ele fala da importância de conhecer a singularidade dos sujeitos, inseridos num contexto mais amplo, quando trata de significado e sentido, e das relações do sujeito com o saber, permite a reflexão sobre diversos aspectos do que pretendo investigar.

Diferentemente das pesquisas apresentadas por Charlot (1996), me proponho a estudar a sala de aula e não a escola, embora não se possa considerar aquela desvinculada desta. Pretendo investigar, em uma sala de aula, práticas de ensino de estratégias de leitura e como os alunos se apropriam destas e as utilizam para construir os sentidos dos textos.

Sendo a leitura aspecto fundamental para o sucesso ou fracassso escolar, entendo que minha preocupação se aproxima da discussão que ele faz em “Relação com o saber e com a escola entre estudantes de periferia”. Partindo de postulados que apontam, num contexto mais amplo, que bons leitores utilizam determinadas estratégias para elaborarem os sentidos, me proponho a investigar os processos singulares de aprendizagem das estratégias de leitura no contexto da sala de aula.

Penso que os conceitos apresentados por Charlot (1996), retomando Leontiev, de significado (social) e sentido (individual), fracasso e sucesso escolar, e de relação com a escola e com o saber, têm me ajudado muito a pensar sobre como realizar minha pesquisa.

A relação com a escola e com o saber é uma relação de sentido engendrada e alimentada pelos móbiles que se enraízam na vida individual e social, mas é também relação com um saber que a criança, para se formar, deve se apropriar de maneira eficaz. (CHARLOT, 1996, p. 50)

Entendo que a maior parte do que se tem feito em relação ao ensino de leitura, afirmando pretender a construção do gosto, do hábito e do prazer na leitura, constitui-se em motivação e não em mobilização, pois esta depende da relação individual que cada sujeito estabelece com o objeto de estudo e ao sentido que esta possui. Charlot afirma que. “Motiva-se alguém de fora, mas se mobiliza de dentro. [...] É importante compreender que a mobilização é interna e supõe um desejo do próprio aluno.” (CHARLOT, 2005, entrevista). Afirma, ainda, que, “a criança mobiliza-se, em uma atividade, quando investe nela, quando faz uso de si mesma como de um recurso, quando é posta em movimento por móbeis que remetem a um desejo, um sentido, um valor.” (CHARLOT, 2000, p. 55)

Penso que no que tange aos diferentes saberes escolares, inclusive à leitura, a mobilização é fator determinante.

Como, em minha pesquisa, serei pesquisadora e atuarei como professora (embora não titular) da turma investigada, me preocupo também com o papel do professor para a mobilização dos saberes. Neste sentido, as pesquisas de Charlot podem contribuir pois, embora os processos que identificam o “bom professor” sejam singulares e ocorram de maneira diferente para cada um, alguns aspectos levantados em suas pesquisas a partir do que apresentam os alunos podem ser pistas para o docente refletir sobre seu papel e suas maneiras de agir e de conduzir os processos de ensino em sala de aula, a partir das afirmações de alunos. “[...] o bom professor se esforça, explica bem e repete com paciência, provoca a vontade de estudar, é tranquilo[...]”  (CHARLOT, 1996, p. 54)

Ainda que o professor tenha papel fundamental, entendo que só o ele e, no caso da minha pesquisa, o professor com uma determinada metodologia de ensino, não são elementos suficientes para mobilizar todos os alunos para o saber. Os estudos de Charlot mostraram que a mobilização na escola também depende de fatores externos, que constituem a mobilização para a escola. Esta não determina a mobilização na escola, mas estabelece relação.

Vislumbro um desafio fascinante e talvez doloroso, no desenvolvimento de minha pesquisa para que eu possa pensar em ações que contribuam para a mobilização dos alunos para a leitura. Assim, me pergunto: porque alguns gostam e outros não gostam de ler? Como mobilizar os alunos para que leiam mesmo quando não estão sendo cobrados? Mais do que saber utilizar estratégias para construir uma compreensão e, mesmo anterior a essas não estaria a mobilização para a aprendizagem delas?

A partir dos estudos de Charlot entendo que a mobilização para este saber (que é, ao mesmo tempo uma ação) é essencial para que se faça da leitura algo constante na vida dos alunos e assim, ao lerem poderão aprender diferentes conteúdos, bem como aprender mais sobre o próprio processo de leitura. Não conseguirei responder a todas essas perguntas em minha pesquisa, mas elas permanecerão em minha mente, me incomodando e, porque não, me mobilizando na busca por possíveis respostas.

Referências

CHARLOT, Bernard. Relação com o saber e com a escola entre estudantes de periferia. In: Cadernos de Pesquisa, n. 97, São Paulo, maio, 1996.

CHARLOT, Bernard. Da relação com o saber: elementos para uma teoria. Porto Alegre: Artmed, 2000.

CHARLOT, Bernard. A escola e o saber. 2005. Disponível em: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/ent_a.php?t=006. Acesso: 15/11/2012

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