quarta-feira, 29 de outubro de 2014

O fluxo contínuo da experiência na pesquisa educacional

Reflexões a partir do texto:

BROENS, M. C.; ANDRADE, E.B.; PILAN, F.C. A noção de fluxo contínuo da experiência: contribuições de Dewey para a Ciência Cognitiva. In: Cognitio-estudos - revista eletrônica de filosofia, vol. 5, nº 1. São Paulo, 2008, p.25-32.

Por muito tempo acreditamos que a mente e o corpo eram elementos distintos e até opostos, apesar de ambos comporem o ser humano. Também, por influência da tradição racionalista e pelas concepções de Descartes, aprendemos que o corpo possibilita, pelos cinco sentidos, uma construção perceptiva do mundo, a qual é falível e pode nos induzir a equívocos de compreensão das coisas.

Assim, fomos ensinados a duvidar de nossas percepções sensoriais, a não confiar nas nossas emoções e, até, a rejeitá-las, porque a experiência cotidiana seria duvidosa e não serviria para o desenvolvimento de um método de análise confiável. Neste sentido, a mente, ou seja, a razão, ocupou lugar de destaque na sociedade ocidental, já que haveria uma dualidade e que a mente seria a única faceta fiável de nosso ser.

Na escola básica, desde que ocupávamos a posição de alunos, fomos ensinados a aceitar que os textos mais formais, mais reflexivos e complexos não levariam a marca da 1ª pessoa do singular e usariam a argumentação sustentada em uma lógica, sem apelos emocionais, já que a razão deveria prevalecer.

Essa tentativa de separação entre a singularidade e a universalidade é, para Dewey, um reducionismo simplista que resulta em menosprezo ao ambiente, com o qual o ser humano interage e a partir do qual aprende. Negar a experiência cotidiana é, portanto, camuflar a realidade das situações, pressupondo que a "teoria" seria melhor que a prática e que poderia se sustentar sem ela, quando, na verdade, seria apenas um recorte da vida, que não particulariza, que não capta os detalhes distintivos dos eventos, das situações e das pessoas.

Para superar a dicotomia mente-corpo, Dewey propôs que o fluxo contínuo da experiência seja valorizado, ou seja, sem separar das emoções, de fatos, de lógica etc. Assim, a experiência seria compreendida como o processo constante de ação e de reflexão acerca do cotidiano, garantindo que experiências indissociáveis entre si possam interagir "ativo-passiva com e do ambiente", construindo uma rede de pensamentos e ações que implicam em mudanças de atitude do sujeito.

Na escola básica, local onde acontecem muitas pesquisas educacionais, até que ponto valorizamos as experiências cotidianas dos educadores e alunos? Na análise de dados coletados na pesquisa, o quanto valorizamos as emoções, as singularidades de cada objeto/sujeito participante? O quanto acompanhamos a mudança de hábitos destas mesmas pessoas a partir de processos de reflexão sobre as práticas, incentivando-os a valorizar a experiência?

Isto não significa, de forma alguma, manutenção de todas as práticas desenvolvidas na escola, mas mostra aos membros de uma comunidade escolar, o quanto as vivências de cada um podem ajudar nos processos de análise das situações. Os "erros" cometidos pelo grupo escola ou na ação individualizada de cada membro  não são elementos apenas negativos, pois, no movimento da experiência ativa e passiva (ação e reflexão), eles ajudam a construir previsões de experiências futuras, na tentativa de não mais cair no mesmo equívoco. 

Pensando no professor e na sua formação continuada, o fluxo contínuo da experiência aponta-nos um caminho: não apresentarmos uma teoria de como ensinar sem conhecer o cotidiano do professor e sem que ele também a conheça, sendo capaz de falar e de agir consciente do que faz. Neste campo, a observação das aulas e a conversa com os docentes se transformam em estratégias relevantes, para que, juntos a eles, possamos elaborar um plano de intervenção, que vise à melhoria educacional.

Gislene Aparecida da Silva Barbosa






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