segunda-feira, 27 de outubro de 2014


“Se você for uma pessoa que busca realmente a verdade, é necessário que ao menos uma vez na vida duvide de todas as coisas, da maneira mais profunda”.

Descartes

            Infelizmente não pude comparecer na conversa realizada com Bernard Charlot na Universidade no último dia 3/10, entretanto faço uso a partir de agora do texto “A mistificação pedagógica: as formas contemporâneas de um processo perene - prefácio à nova edição brasileira” para refletir sobre a a educação que vemos e vivemos nas escolas em geral.
          O texto todo é muito interessante, mas gostaria de ressaltar aqui a crítica que Charlot (2013) faz em relação a Pedagogia vigente no Brasil, pois de acordo com o autor tanto a “Pedagogia Tradicional”, quanto a “Pedagogia Nova”, desconsidera a realidade social dos alunos, ou seja, ainda há de acordo com Charlot (2013) no interior das escolas brasileiras uma grande distância entre o discurso pedagógico e a realidade social.
         Além disso, o autor afirma ainda que as desigualdades sociais presentes na sociedade brasileira são um fator importante no fracasso escolar.
         Uma grande parte dos professores tem a concepção de que todos os sujeitos são "iguais" e tem a mesma capacidade, entretanto tal fato desrespeita a individualidade dos sujeitos. Neste sentido, uma ideia recorrente no âmbito escolar é que o insucesso da criança na escola pública é o resultado de sua própria “escolha”, de sua “falta de vontade” de estudar, como se todas as pessoas fossem livres e capazes de ascender social e culturalmente.
           Tal fato torna-se prejudicial para a instituição escolar, pois a crença (sinônimo de fé) do docente orienta sua prática pedagógica e faz com que o educador acredite que o hipotético insucesso da criança na escola pública é resultado da falta de vontade dos alunos de aprender, ou seja, essa fé não causa movimento e mudanças na educação. Neste sentido, Peirce afirma que aquilo que chamamos usualmente de crença não tem lugar em ciência.
          No ambiente escolar, quando os educadores creem no fato de que “o aluno não aprende porque não quer”, os docentes deixam de questionar suas práticas, reforçam a exclusão social na escola e acreditam na neutralidade do seu trabalho. Neste sentido, este educador não considera a educação como “um processo antropológico, social, cultural complexo.” (Charlot, 2013, p. 40).
         De acordo com Pierce (S/N) a crença guia o desejo e molda a ação, pois é a partir daquilo que o educador acredita que ele irá traçar planos para a sua pesquisa, porque cremos em muitas coisas que descobrimos, tanto pelo senso comum como pelo trabalho científico.
          Assim sendo, pode-se afirmar que quando se tem a ideia de que o aluno pobre é o culpado pelo seu processo ou não de aprendizagem, os docentes não terão dúvidas, ou seja, não passarão por um estado de desconforto e insatisfação. Desta forma, ficarão acomodados e não usarão o método científico para questionar a realidade na qual estão inseridos.
          Esse texto chamou muito a minha atenção quando fui lê-lo, pois ao fazer uma atividade com um grupo de professores, ouvi dos mesmos que as crianças não seriam capazes de utilizar suas estratégias de leitura porque “elas eram pobres”. Observei então, o quanto nossa falta de dúvidas é nociva para o processo educacional.
          Se o indivíduo faz parte de uma diversidade de instituições como a família, a escola, entre outras; e desta forma constrói sua identidade a partir da intervenção e relação que estabelece com o outro, se o docente (neste caso o outro/mediador) não acredita que o aluno possa aprender, então não cumpre o seu papel e nega ao estudante o seu direito de ter acesso aos bens culturais.
 
Um abraço,

Silvana

 CHARLOT, B. A mistificação pedagógica: as formas contemporâneas de um processo perene - prefácio à nova edição brasileira. In: _____. A mistificação pedagógica: realidades sociais e processos ideológicos na teoria da educação. São Paulo: Cortez, 2013. p. 33-50.

 PIERCE, Charles Sandres – Ilustrações da Lógica da Ciência. Aparecida: Ideias & Letras.

 
 
 
 
 
 


           

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